O mais antigo entre os clássicos envolvendo os quatro grandes clubes do estado de São Paulo é um duelo entre equipes que, a princípio, não teriam tantos motivos assim para serem rivais. Mas a história – e sobretudo a Era Pelé – trataram de fazer que Santos x Corinthians se tornasse uma rivalidade cheia de casos e personagens interessantes. No dia de mais um duelo, pelo Brasileirão, o FIFA.com relembra um pouco dessa história.

As origens
   Quando Sport Club Corinthians Paulista e Santos Futebol Clube se alinhavam para se enfrentar pela primeira vez na história, em 6 de março de 1913, os dois lados não podiam imaginar que aquele um dia se tornaria um encontro tradicional entre dois rivais. Afinal, nem mesmo da mesma cidade os dois clubes eram, e até as mesmas cores – branco e preto – ambos passariam a usar dali a alguns dias, quando os santistas abandonariam o branco, azul e dourado. Que rivalidade poderia nascer daquilo?

  Durante muitos anos, de fato, seria difícil falar em rivais, porque de um lado estava o Corinthians colecionando títulos estaduais e, do outro, uma equipe santista que raramente fazia mais do que ser figurante ilustre. No ano em que o Santos conquistou seu primeiro Campeonato Paulista, em 1935, os corintianos – justamente os derrotados na decisão - já somavam oito conquistas. E, no entanto, ainda assim o Corinthians já tinha percebido que aquele adversário praiano tinha qualquer coisa de mais complicado do que o normal.

   Até aquele ano de 35, as equipes já haviam se enfrentado 32 vezes, com cinco empates, 14 vitórias corintianas e 13 santistas – inclusive a daquele primeiro confronto no Campo do Parque Antarctica, em 1913, por 6 a 3. O clássico mais antigo do estado de São Paulo nem percebeu, mas na verdade já tinha nascido e crescido.

Os números
  
O duelo também nem sabia, mas desde o início já começou apontando para uma tendência histórica: a dos tabus. Embora durante suas primeiras décadas de vida tenha sido um clube menos vitorioso do que o Corinthians, o Santos foi quem deu as cartas no início e, após vencer o primeiro encontro, ainda permaneceu invicto nas cinco partidas seguintes, num total de seis anos. Foi só em 1919 que o Timão derrotou o adversário pela primeira vez – uma goleada por 5 a 0 – e, então, foi a vez de equipe da capital emendar uma série de sete jogos sem perder para o Santos, até 1924, que incluiu a maior goleada da história do confronto, um 11 a 0 fora de casa, na Vila Belmiro, em 1920.

   No total, até a partida desta quarta-feira pelo primeiro turno do Campeonato Brasileiro de 2011, foram 298 jogos, com vantagem para o Corinthians, que venceu 122 vezes. O Santos tem 94 vitórias, e os dois saíram empatados em 82 ocasiões.

Agora sim clássico
  
Pois o duelo alvinegro é, sim, o mais antigo de São Paulo, mas a verdade é que Santos x Corinthians só passou a ser um clássico mesmo, desses que criam enredos e produzem grandes personagens, a partir da década de 1950. Não por coincidência, a década em que os santistas começaram a montar uma das maiores equipes da história do futebol, depois de receber, vindo de Bauru, um tal Pelé.

   Foi sobretudo na órbita de Pelé que nasceu o mais famoso dos tabus envolvendo o clássico. Durante todo o auge de sua fase com o Santos, o Corinthians foi a vítima preferida do Rei: em 48 jogos contra o Timão, ele marcou nada menos do que 50 gols. E assim se formou o tabu: ao longo de 11 anos, foram 22 jogos sem que o Peixe perdesse o duelo em Campeonatos Paulistas – que, na época, era o que havia de mais valioso para os dois clubes: entre 29 de dezembro de 1956 e 13 de março de 1968. Nesse dia, comandados por Rivelino, os corintianos comemoraram como se fosse uma taça os 2 a 0 que colocaram Flávio e Paulo Borges, autores dos gols, como ídolos na galeria do clube.

   Mas, enquanto o Santos conquistava o mundo, ainda custaria muito para que uma taça voltasse a ir para o Parque São Jorge. Conta-se folcloricamente que, depois de levar uma entrada violenta do zagueiro Ari Clemente num amistoso que a Seleção Brasileira fez contra o Corinthians pouco antes da Copa do Mundo da FIFA de 1958, Pelé teria jurado que, enquanto ele jogasse futebol, o Corinthians não seria campeão. Pode até ser lenda, mas o fato é que o Timão só encerrou seu jejum de títulos, que vinha desde 1954, em outubro de 1977, doze dias depois de Pelé encerrar oficialmente sua carreira, nos Estados Unidos.

   Só que, terminada a Era Pelé, o Santos entrou numa compreensível síndrome de abstinência. Levou um tempo até a equipe se reestruturar e, durante esse ocaso, o Corinthians se aproveitou: durante sete anos, entre 1976 e 83, a equipe não perdeu para os santistas nem uma vez sequer. Quem vivia jejum de titulo, então, era o Santos, que só viu o tormento acabar no Paulistão de 1984, graças a um gol de Serginho Chulapa na vitória por 1 a 0 sobre... o Corinthians, claro.

   Durante a década de 90, pelo menos simbolicamente, o Corinthians deu um pouco do troco em Pelé. Foi no dia 1º de fevereiro de 1996, quando, na Vila Belmiro, Marcelinho Carioca escreveu um capítulo lindo da história do clássico: recebeu passe na entrada da área e, de primeira, com o calcanhar, deu um chapéu no zagueiro que veio lhe dar combate. Sem deixar a bola cair no chão, acertou um chute de chapa, no canto esquerdo do goleiro Edinho. Edinho, no caso, diminutivo de Edson, o nome que o então camisa 1 santista herdara de seu pai, Pelé. Foi o próprio Pelé que, depois, presenteou Marcelinho com uma placa comemorativa pelo maravilhoso gol no empate em 2 a 2.

   Mas, se o assunto é a capacidade de cunhar ídolos, é difícil pensar em uma ocasião mais marcante do que a única em que santistas e corintianos decidiram um Campeonato Brasileiro, em 2002. Naquela época, o Santos era um azarão que por pouco não fora eliminado na primeira fase do torneio; uma equipe muito jovem, que cresceu na fase de mata-matas graças ao atrevimento de duas promessas: Diego e, principalmente, Robinho. No dia 15 de dezembro, dia do segundo jogo da final, Robinho deixou de ser promessa. Ganhou seu primeiro lance de antologia e, minutos depois, seu primeiro título como profissional. Foi uma série interminável das pedaladas que se tornariam sua marca registrada. Com elas, ele levou o volante corintiano Rogério cada vez mais para trás dentro de sua área, onde acabou cometendo o pênalti. O próprio Robinho bateu e abriu caminho para o título nacional que o catapultou para a fama.

Na atualidade
  
Durante os últimos anos, a rivalidade entre Santos e Corinthians se acendeu ainda mais graças a duas decisões de título num período curto. A primeira foi aquela que coroou a passagem de Ronaldo Fenômeno pelo Timão: a decisão do Campeonato Paulista de 2009 que terminou com uma vitória por 3 a 1 dos corintianos na Vila Belmiro, com dois gols do camisa 9, um deles de cobertura, com a perna esquerda, que o próprio Ronaldo considera um dos mais bonitos de sua carreira. E, finalmente, já neste ano de 2011, foi a vez de o embate Santos x Corinthians ajudar a construir a imagem vencedora de outro ídolo: agora Neymar, estrela da equipe campeã paulista em maio, com uma vitória por 2 a 1.